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POSSE E PROPRIEDADE

por Realdo Correa

1 Introdução

O objetivo deste artigo é discorrer sobre a propriedade e a posse de forma que suas diferenças sejam mais claras.

É farta a doutrina que se aprofundam no direito da Propriedade e da Posse. Os doutrinadores pesquisados afirmam que os dispositivos legais visam garantir o pleno ordenamento das funções sociais de cada instituto, além de garantir o bem estar de seus habitantes entre os conflitos que abarcam ambos institutos.

Durante muito tempo os institutos da propriedade e da posse andaram junto, às vezes confundidos um com o outro entre os leigos, a posse muitas vezes usada como sinônimo de propriedade. Ambos institutos totalmente distintos entre si, o qual nunca devem ser confundidos entre os operadores do direito e por alguns prestadores de serviços da área.

Conhecer os conceitos e fundamentos de ambos os institutos é fundamental para podermos entender a diferenciar um do outro.

A metodologia a ser utilizada será a pesquisa bibliográfica onde buscaremos conhecimentos embasados nas vozes dos doutrinadores.

2 Propriedade

Não há como falar de Posse sem conhecer a Propriedade. Pois é da posse como requisito formal que origina o direito de usucapir um imóvel ou uma coisa, tornando a Posse em Propriedade.

Desde os tempos remotos, a aquisição de bens sempre teve importância para o homem, a propriedade tem sido alvo de atenção entre os filósofos, economista, jurista e estudiosos do tema, que têm em comum o objetivo de determinar sua origem, evolução, regime, função social e função individual. O certo é que a necessidade de demarcação de uma área acontecia quando havia reinvindicação à essa área, e o Direito de Propriedade é o mais importante de todos os Direitos Subjetivos. (ALMEIDA, Washington Carlos, 2013, p. 44)

O conceito de propriedade privada foi desenvolvido entre os romanos e foi chamado de dominium. Conceito este aplicado aos escravos e aos imóveis que deveria atender aos critérios para ser categorizado como dominium: estar dentro da legalidade, ser absoluto, permanente e exclusivo.

A Propriedade não deve ser confundida com Domínio, porque a primeira é gênero, domínio só compreende o que recai sobre direitos reais.

A palavra domínio é derivada do Latim=dominium que significa a propriedade ou o próprio direito de propriedade.

Domínio ou propriedade são palavras que se equivalem para os efeitos jurídicos, inclusive pela máxima: Dominium mihi, id est, proprietas.

Luiz Edson Fachin ensina que “a conceituação do Direito de Propriedade constitui tema que trespassa o universo estrito do Direito Positivo[1], não conseguindo, pela sua natureza, minimizar-se diante de situações metajurídicas substanciais. Se revela na apreciação do elemento histórico e na constatação de que o conceito não existe isolado de um sistema. (ALMEIDA, Washington Carlos, 2013, p. 45).

Para Cézar Fiúza, a propriedade pode ser definida como “a situação jurídica consistente em uma relação dinâmica entre uma pessoa, o dono, e a coletividade, em virtude da que são assegurados àquele os direitos exclusivos de usar, fruir, dispor e reivindicar um bem, respeitados os direitos coletivos.” (ALMEIDA, 2013, p.45)

No entanto, para Rubens Limongi França, “a propriedade é o direito, excludente de outrem, que dentro dos limites do interesse público social, submete juridicamente coisa corpórea, em todas as suas relações, ao poder da vontade do sujeito, mesmo quando, injustamente, esteja sob a detenção física de outrem.” (ALMEIDA, 2013, p.45)

Como ensina ORLANDO GOMES, a propriedade é o principal modo de expressão e representação dos direitos reais “na perspectiva dos poderes do titular, a propriedade é o mais amplo direito de utilização econômica das coisas, direta ou indiretamente.” (FIGUEIRE, 2010, p. 5)

O direito da propriedade é visto pela maioria dos estudiosos como um direito do homem, tal qual o direito à vida e à liberdade. O direito de Propriedade, assim como outros Direitos Privados, deve ser visto sob o prisma de sua função social, descrita em consonância com a Constituição Federal, que dispõe em seu art. 5º XXII, XXIII:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito á vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.

(...)

XXII - é garantido o direito de propriedade;

XXIII – a propriedade atenderá a sua função social;

Trata-se de um direito garantido em toda a sua plenitude, que na esfera da Constituição Federal, que nas Leis da natureza cível vigente no País, que tecnicamente estabelece a norma no artigo 1.228 do Código Civil:

O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa e o direito de reavê-la do poder de quem quer que a injustamente a possua ou detenha.

Para melhor entendermos o conceito de propriedade, passaremos à analisar os elementos do domínio: usar, gozar, dispor e reivindicar a coisa.

Juz utendi é o direito de usar a coisa como se sua fosse, tirando todos os serviços que puder prestar, mas sem modificar sua substancia e limitando-se ao bem estar da coletividade. (DINIZ, Maria Helena, 2013, p. 135)

Jus fruendi é o direito da percepção dos frutos e da utilização dos produtos da coisa, podendo explorar economicamente. ((FANTI, Alexandre, 2009, p. 32)

Jus abutendiou disponendi é o direito de dispor a coisa, podendo o proprietário alienar, gravar, hipotecar, consumir, doar, penhorar a coisa. (FANTI, Alexandre, 2009, p. 31)

E finalmente, rei vindicatio é o direito do proprietário de buscar a coisa de quem quer a detenha, conhecido como direito de sequela e erga omnes.

3 Posse

Existem poucas matérias que tenham dado margem há tantas controvérsias como a posse.

A posse muitas vezes é usada como sinônimo de propriedade. O instituto da posse difere totalmente do instituto da propriedade, já mais poderão ser confundidos ambos os institutos, mesmo tendo relação uma com a outra.

O termo “posse” vem do latim possessio, constitui um dos elementos dos Direitos Reais[2], que está inserido no Direito das Coisas, na categoria dos Direitos Patrimoniais. (ALMEIDA, 2013, p.17).

3.1 Origem e conceito da posse

Desde os tempos remotos, a posse e a propriedade sempre estiveram presentes entre os homens. Enquanto a posse é um fato natural, a propriedade decorre da lei.

Não há entendimento harmônico a respeito da origem da posse. Diversas versões são conhecidas, no entanto, podem ser representada por dois grupos representado pela teoria de Niebuhr, adotada por Savigny e pela teoria jurista de Ihering. A teoria de Niebuhr defende a tese de que a posse surgiu com a repartição de terras conquistadas pelos romanos, passando a ser um estado de fato protegido pelo interdito possessório. Enquanto para Ihering a posse é consequência do processo reivindicatório. (DINIZ, 2013. P.45 e 46)

A primeira é a teoria subjetiva, defendida por Savigny, é a junção do corpus (detenção física do bem) e do animus (elemento subjetivo, vontade de ter a coisa como sua). Entende que a posse é um fato e um direito.

A segunda é a teoria é objetiva, defendida por Ihering, basta apenas o corpus, ou seja, o exercício de fato dos poderes sobre a coisa. Entende que a posse é um direito. Todavia não é detenção física da coisa, mas conduta de dono, sendo este reconhecido pela maioria de nossos civilistas.

No ordenamento brasileiro, o nosso código civil revogado, filiou-se a teoria de Ihering, ou seja, considerando possuidor o simples detentor da coisa, independentemente do animus, porque o simples fato de se constatar alguém ocupando materialmente a coisa e atuando materialmente sobre ela, segundo a teoria da aparência, presume-se que a coisa lhe pertence. O Código, para as defesas possessórias, adotou a teoria Ihering, mas para criar o Instituto Jurídico da Usucapião adotou a teoria de Savigny, ou seja exige e animus de dono. (BORGES, 2013, p.83)

A posse nada mais é que exercício de fato, pleno ou não, de um dos poderes inerente ao domínio[3].

Assim sendo, para Ihering a posse é a exteriorização ou visibilidade da propriedade, ou seja, a relação exterior intencional, existente normalmente entre o proprietário e sua coisa. Enquanto para Savigny a posse é um fato que se converte em direito protegido por lei.

A Teoria Objetiva foi adotada pelo Código Civil Brasileiro, o artigo 1.196 não chega a conceituar a posse, mas pela definição que dá ao possuidor, quando diz que “a posse” é o exercício, pleno ou não, de fato dos poderes constitutivos do domínio ou somente de alguns deles. Caracterizando a posse como a exteriorização da conduta de quem procede normalmente como dono. Portanto o possuidor é quem tem o pleno exercício de fatos dos poderes constitutivos de propriedade ou somente alguns deles, como no caso dos direitos reais sobre coisa alheia.

3.2 Posse justa e injusta

Quanto aos vícios objetivos, a posse é justa ou injusta.(artigo 1200 Código Civil).

A posse justa está descrita no artigo 1.200[4] do Código Civil, sendo aquela que não está maculada, ou seja, que não é violenta, clandestina ou precária. Sendo injusta, quando for o contrário.

Pode ser classificada ao mesmo tempo injusta quanto a uma pessoa, mas justa quanto a terceiras pessoas.

3.3 Posse violenta e posse clandestina

Será violenta quando houver o esbulho com emprego de força, de ameaças, constrangimentos, resistências, conflitos e coações. Enquanto ocorre violência não há posse. (BORGES, 2013, p.157)

Será clandestina quando não for violenta mas for adquirida sorrateiramente, ou seja, as escondidas, invasão, dissimulado, disfarçada.

Por outro lado, será precária quando a posse for obtida mediante confiança, se diferenciando das demais em razão do momento da macula.

3.4 Posse direta e indireta

Quanto a extensão de garantia possessória, a posse é direta ou indireta.(artigo 1.197 e 1.198 do Código Civil)

A posse direta é daquele que cede o uso do bem outra pessoa através de algum tipo de contrato.

Já a posse Indireta é daquele que recebe o bem de outra pessoa, para usá-lo ou gozá-lo, em virtude de contrato, sendo, portanto temporária e derivada.

3.5 Posse de boa-fé e má-fé

Quanto a subjetividade, a posse é de boa-fé ou má-fé. (artigo 1.201, parágrafo único e 1.202 do Código Civil)

A posse de boa-fé constitui um conceito fundamentalmente ético de difícil definição, quando o possuidor está convencido de seu direito de posse, ignorando o vício que impede a aquisição de coisa. O possuidor tem plena convicção que a coisa realmente lhe pertence.

A posse de boa-fé não deve ser confundida com o animus domini, pois para haver boa-fé é preciso que o possuidor ignore o direito de terceiro sobre a coisa. Enquanto a má-fé diz respeito ao possuidor que tem conhecimento da ilegalidade de seu direito de possuir a posse da coisa. (ALMEIDA, 2013, p. 28)

O artigo 1.201 e parágrafo único do Código Civil, contempla que a posse de boa-fé do seguinte modo: “É de boa-fé a posse, se o possuidor ignora o vício, o obstáculo que impede a aquisição da coisa. O possuidor com justo título tem por sí a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário, ou quando a lei expressamente não admite esta presunção”. Ocorrendo, então esta posse quando o possuidor está convicto de que a coisa, realmente, lhe pertença ignorando assim que está prejudicando terceiros. Tanto é verdade que o artigo 1.202 do Código Civil perde a posse de boa-fé “este caráter desde o momento em que as circunstâncias façam presumir que o possuidor não ignora que possui indevidamente”. A doutrina tem apontado como circunstancia presuntiva de má-fé: citação judicial; usufruto sobre o imóvel possuído; nulidade do título; confissão do possuidor de que nunca teve título. (DINIZ, 2013, p. 75)

A posse de má-fé é aquela em que o possuidor tem ciência da ilegitimidade do seu direito de posse, em virtude do vício ou obstáculo impeditivo de sua aquisição, na qual, entretanto, se conserva, começando deste o momento em que há presunção do conhecimento.

3.6 Detenção

Possuidor é aquele que age como dono, diferente da detenção. A detenção, também é conhecida como “fâmulo da posse”.

Detentor[5] é aquele que, em virtude de sua situação de dependência econômica ou de um vínculo de subordinação, em relação a uma outra pessoa, ou seja, possuidor direto, exerce sobre o bem não uma posse própria, mas uma posse em nome do possuidor direto, não se comportando assim como dono da coisa e sim como uma certa subordinação. O detentor pode, no interesse do possuidor, exercer a autodefesa do bem sob seu poder. É o que ocorre com o empregado doméstico ou prestadores de serviços em geral.

A permissão exige conduta positiva do possuidor, que, sem perda do controle e da vigilância sobre a coisa, entrega-a voluntariamente a terceiro para que este tenha momentaneamente.

3.7 Com Posse

Quanto à simultaneidade, a posse pode ser dividida com outras pessoas, de forma que cada uma exerça seu direito individual de coisa indivisa. (artigo 1.199 do Código Civil).

Perante terceiros, cada um representa a posse dos seus consortes, agindo como se fossem único dono.

De modo que a coisa indivisa pode ser possuída em comum desde que o exercício do direito de posse de um não prejudique o direito de posse do outro, os atos possessórios de um não podem excluir os atos possessórios do outro. (DINIZ, 2013, p. 72)

4 Conclusão

Assim, podemos finalizar este artigo, concluindo que a propriedade e posse não se confundem.

A Propriedade e Posse tem raízes antigas entre os homens, sempre foram temas de discórdia entre os homens e até nações, durante muito tempo.

Nos dias atuais a disputa em geral tem se amenizado entre os povos existe, mas sempre disputado de alguma forma no judiciário.

Com o passar dos anos, nossa legislação vem avançando na busca para atender os diversos conflitos da propriedade e da posse. Tanto as doutrinas, jurisprudências e súmulas mais contemporâneas estão se adequando a nossa realidade social e aos problemas que surgem por essa enorme desigualdade.